Regiane Mastellari Doria
Médica e escritora, ela inicia nova fase literária após lançamento na Bienal do Livro 2024
‘É sol, é céu, é mar’… Lembra até trechinho da letra de uma música inesquecível de Tom Jobim, mas, não importa se pela vista deslumbrante, por hobby ou como refúgio. O fato é que em um lugar assim, um recanto paradisíaco do litoral paulista com palmeiras, areia fofa e águas azuis e transparentes, que Regiane Mastellari Doria se ‘reabastece’ de força e ideias para dar continuidade à sua rotina diária.
Bióloga, médica, escritora – lançou um livro recentemente, na Bienal do Livro -, além de musicista (compositora também) e pintora, dizer que ela é multifacetada seria pouco.
Andreense, ela conta que começou a tocar piano, pintar e escrever ainda criança/adolescente, e nunca mais parou. Além da sagrada Medicina, que exerce virtual ou presencialmente, Regiane compõe – ou simplesmente toca -, ou então ‘abraça’ uma tela, tintas e pinceis, colocando em cores o seu momento de inspiração. “Atualmente sigo a letra daquela música: ‘Ando devagar, porque já tive pressa’… Então, seguindo essa filosofia de vida, procuro respirar mais, silenciar mais, ponderar minhas decisões para exercer minhas ações. E assim, caminhando com calma, um dia de cada vez, vou construindo minha vida, meu presente e meu futuro. E, especialmente, vou tendo bons momentos”.
Da Redação
Ela confessa que gosta de tomar seu café tranquilamente, com a família, conversando, para iniciar um bom dia, que preza muito a alimentação dita saudável e o slow food, que, em tradução livre, significa comer sem pressa. É só depois desse ritual, que Regiane segue para a sua rotina, que pode ser um dia envolvendo meditação, exercícios, ou andanças pela praia (se estiver por lá). Tem dias que são totalmente dedicados ao atual livro, que está escrevendo. E outros voltados para a medicina que, nesse caso, envolve atendimento online ou presencial, caso o/a paciente já tenha passado por um atendimento inicial que envolveu uma longa anamnese, um exame físico minucioso e uma boa conversa”.
É essa visão de cuidado integral com o paciente que ilustra bem a ‘guinada’ dada por Regiane ao longo da sua carreira, que teve início com Ginecologia e Obstetrícia, na qual fez residência e se especializou, atuando por muitos anos nas áreas clínica e cirúrgica. “Estudei Medicina Biomolecular, me especializei em Nutrologia, Medicina do Trabalho e Medicina Integrativa, áreas onde aprendi e aprendo muito sobre a ciência médica. E tenho enveredado pela Fototerapia, Biofísica e Radiestesia, as quais muitas vezes associo ao atendimento. Não desmembro a alma do corpo. Essa conexão energética, espiritual, permeia meus estudos e reflexões”.
Meditando sobre esse cenário, Regiane diz que, para ela, ser médica é uma grande responsabilidade, uma missão peculiar, que envolve os sentimentos mais sublimes. Felizmente, compreendi isso bem no começo de minha carreira, quando essa belíssima profissão se conectou com meu coração. Vejo o seguinte. Quando você senta na cadeira de um consultório, ou fica em pé ao lado de um doente num leito de um hospital, ou na maca de um pronto socorro, tem ali, bem na sua frente, uma pessoa com todas as fragilidades e resistências emocionais, bem como o enfrentamento dos desafios de uma doença. Esse indivíduo está precisando de ajuda. Ao te procurar, ou cair aleatoriamente em suas mãos, está com medo, mas, em seu âmago, acredita que você pode fazer algo por ele, que pode melhorá-lo, por vezes salvá-lo. E ele está certo. O médico pode, na maioria das vezes realizar tudo isso, ou seja, amenizar as dores, curar, salvar. Sendo assim, tornar-se médico é uma decisão importante, não pode ser leviana, porque você lida com vidas”.
Sobre tudo isso, Regiane afirma sua convicção de que, além do estetoscópio e outros instrumentos, todo médico deve sempre levar consigo outro melhor e mais eficiente instrumento, que é o “Amor… Esse instrumento especial consegue verdadeiros milagres. E, se junto a essa ferramenta, esse profissional adicionar a compaixão, o estado incondicional e o respeito, pode-se afirmar que o paciente está em boas mãos”.
Por estar sempre vivendo diante da vulnerabilidade e debilidade humana, a médica frisa que procura estudar bastante e constantemente. “Estudo tanto os avanços da medicina convencional quanto da medicina não convencional. E, embora tenha optado por trabalhar mais na área não convencional, reconheço que é totalmente possível usar o melhor dessas duas vertentes. Às vezes, uma situação clínica exige uma abordagem invasiva como a cirurgia. O que vai orientar minha escolha? A coerência, o bom senso, a viabilidade do caso, como o quadro se apresenta no momento e a decisão do paciente, que deve ser também considerada, quando ele está apto para tanto”.
Na arte, pura inspiração
Sobre este seu outro lado, Regiane relata que a arte a acompanha desde criança. “Toco piano desde os sete anos, pinto desde os nove, escrevo desde os 14. E as inspirações não têm hora para chegar. Passei muitas noites em claro pintando, compondo, escrevendo. A noite sempre é muito benevolente para comigo, me acorda muitas vezes nas madrugadas, com uma ideia, uma melodia, uma imagem para pintar, ou até com um conto quase pronto”, diz ela, contando que o seu segundo livro, Paradoxo, foi escrito em quatro meses, numa total conexão com a criatividade, e claro, de mãos dadas com a insônia!
Também na pintura, a origem é a mesma: inspiração. “Tenho muitos quadros e também presenteei e doei muitos mais. Sempre gostei de pintar nus, ou cenários que me inspirem. Por exemplo, mulheres num barracão, cenas de pescadores, uma parte do corpo, ou um vendedor de tremoços egípcio, com sua bata comprida. O que a inspiração mandar, farei. Misturo as tintas e direciono para a tela. Sem regras. A arte, por si, não pode ser tão rígida, a expressão das emoções, na maioria das vezes, é indisciplinada. E daí, dessa rebeldia expressiva, saem coisas muito boas”.
Segundo ela, atualmente a arte a qual mais se dedica é a escrita, o que significa, permanecer durante horas, na frente de um notebook. “E eu adoro! Viajo por onde escrevo, mergulho nos personagens, nos cenários, me vejo dentro das minhas estórias, parece até que vivo ali, uma verdadeira história. Não me prendi a um único gênero. Escrevo diversos deles. Autoajuda, contos, poesias, espiritualidade, romance, ficção. Também não imponho limites ou regras para essa finalidade, apenas deixo fluir”.
Aliás, recentemente, Regiane lançou seu quinto livro na Bienal de São Paulo, a maior feira de livros da América Latina, intitulado Divina Felina, um livro de contos, totalmente ilustrado, com desenhos de sua autoria, ou melhor dizendo de seu heterônimo que, como destaca, foi muito bem recebido. “Estou iniciando uma etapa, que vem acompanhada com novas oportunidades e a adoção de um nome literário, o qual elegi para meu primeiro heterônimo: Tulli Havry. Foi emocionante estar em meio a tantos escritores e milhares de leitores. É um sonho realizado e um grande presente poder ver pessoas lendo e apreciando aquilo que escrevo”.
O refúgio, sua fonte de inspiração
Mantendo o mistério sobre o seu ‘oásis’ particular, Regiane deixa escapar que recentemente elegeu o refúgio para se dedicar a tudo o que faz na vida: estudar, escrever, meditar, se exercitar, trabalhar, viver a família, a amizade de pessoas especiais, entre outras tantas coisas. “Para tanto, fujo de Santo André periodicamente e vou para esse pequeno paraíso, para ser exata, uma ilha”.
Evoluir como SER: o desafio
Aprender, descobrir, adquirir conhecimentos tanto na Medicina, assim como em outras áreas a motivam – faz parte do seu ser, querer saber sempre mais – e, como detalha, há um universo tão vasto para o aprendizado. “Contudo, creio que assimilar conhecimentos, para crescer meramente no nível intelectual é pouco e beira o vazio para mim, por mais paradoxal que essa afirmação pareça. Sinto que preciso avançar mais que isso, melhorar a qualidade como SER, como pessoa, para ter a capacidade de enxergar o que aprendo com um olhar mais abrangente. Desejo seguir aplicando meu aprendizado, com total competência, ética e retidão. E tenho me dedicado a essa missão individual, como SER. Mas, tenho a humildade de reconhecer que a evolução é um trabalho constante, diário, que certamente durará até minha vida findar”.
Enfim, conforme diz, uma tarefa prazerosa, às vezes penosa, mas que faz valer a pena seguir nessa jornada chamada vida. “E, falando de vida, já vivi rotinas bastante estressantes devido à minha profissão, culminando na pandemia, período que trabalhei sem parar, como todos que ficaram na linha de frente. Depois que passou, decidi tirar o pé do acelerador. Decidi ter tempo, para o tempo que me resta. Tempo para os que convivem comigo na minha intimidade, minha família, meus amados”.
Um momento especial
Objetivos? Projetos? Ela revela que esses sempre surgem na sua mente. “Como posso definir meu atual momento da vida? Por ora, o plano que tenho é atender as pessoas bem carentes desse lugar, cujo nome guardo sob sete conchas. É um projeto embrionário, mas já comecei a realizá-lo. E, quando me chamam, pego minha malinha, coloco o estetoscópio, o aparelho de pressão e aquele amor que citei anteriormente. E ao ver o sorriso, sem dor, naquele que dediquei alguns minutos, sinto-me abençoada. Sinto-me com a sensação plena, de que a vida, apesar das surpresas, da inconstância, dos altos e baixos, tem valido a pena. E sou grata”.